manhã de lua

acordei no escuro e me dei conta de que é a terceira noite seguida que tenho pesadelos (mas só percebo que passei a madrugada vendo coisas horríveis quando já abri os olhos).

fui andando devagar e sentindo a umidade colar na bota ralada, congelando os dedos dos pés. às vezes é gostoso sair enquanto boa parte do bairro ainda dorme (tenho a impressão de que o tempo pára). enquanto andava lembrei das frases do filme de ontem "sempre há alguma coisa acontecendo. não existem momentos comuns". pensei na tarde de sábado, com as crianças e os amigos de tanta coisa. de repente me senti reconfortada por sempre ter sido tão claro pra mim a existência dos pequenos milagres diários. tenho sorte. muita. pensava nisso também ouvindo o barulho dos passos. pensava no que precisa ser feito. quase não me reconheço mais.

(ando doída, de uma tristeza que não vai embora. eu sei que, em certos momentos da vida, não há choro que resolva, não há pedido de socorro que possa ser feito. tem horas em que a gente tem que resolver o que pesa - e tem que ser só. mas, depois de tantos anos vivendo a maturidade do espírito velho, sinto que não tenho forças ou, pior, não tenho mais vontade. quero ficar jogada no meu canto, no silêncio, sem o resto do mundo. quero não ter que provar mais nada pra ninguém. não consigo sair do lugar. não quero mais os desafios. tá tudo pela metade. inclusive eu.)