segunda-feira, novembro 22, 2004
a verdade sobre a dor aguda
Metropolitano, Lapa. Madrugadas no hospital. Sexta pra sábado, sábado para domingo. Domingo pra segunda ninguém agüenta. Nem minha mãe, que tá se superando a cada dia.
Minha mãe é uma mulher fenomenal. E não digo isso só porque ela é minha mãe (no meu caso, o tal do ditado de que “mãe só tem uma” foi pro ralo quando eu ainda tinha dentes de leite). Digo isso como alguém que, no esforço de olhar de fora, enxerga uma mulher admirável.
Tenho uma lista de mulheres admiráveis. Acho mesmo que nós mulheres somos muito mais valentes, mais corajosas, mais íntegras. A ala masculina desse planeta que me perdoe, mas somos mais nobres em essência. Ou acham é a toa que só nós somos capazes de manter no ventre, protegido, um outro ser humano?
A dona Rosmari encabeça, de longe, essa minha lista. Ela foi (continua sendo) a figura feminina que mais influência exerceu sobre a formação dessa menina dos cabelos amarelos – que de menina mesmo tenta só manter o espírito.
E não deve ter sido fácil. Mas eu sei que ela se divertiu tanto quanto eu, e acredito que teria feito tudo outra vez.
Hoje não há mais a angústia desesperada de me fazer o mínimo do que ela é. Os anos me mostraram que isso nunca foi necessário e que, como lógica desse mundo – e que só não era real na minha cabecinha- ela sempre me amou exatamente do jeito que eu era..... e não sabia ser!
E agora mamãe tem que ser ainda mais do que ela sempre foi. Hora de inverter os papéis; hora de ser mãe pra outra mãe.
Dona Cida não anda nada bem. Outra das mulheres admiráveis, que eu tive a sorte grande de ver cair na minha vida. Minha avó, a terceira, a do coração, e que toda segunda, quarta e sexta passa 4 horas sentadinha no hospital, vendo a máquina fazer o trabalho que os rins já não fazem mais.
Hemodiálise. Que ela faz de tudo para não levar como pesadelo, mas que o desgaste tem sido cada vez mais acentuado.
Nesse final de semana, em que eu passei trancafiada por escolha, eu vi de perto o quanto a batalha tá ficando difícil. E me senti minúscula. Fiquei com uma vergonha monstruosa por não ter visto nada daquilo antes. Preocupada demais com o meu próprio umbigo, gastando todas as energias para tapar o buraco do peito, eu não fui capaz de enxergar as coisas ao meu redor.
Dor aguda não é bem aquilo que eu andava sentindo. Dor aguda é você ver alguém que ama profundamente sofrer quieta e não ser capaz de fazer absolutamente nada pra diminuir o tormento.
Dor aguda foi perceber que o tempo foi mais cruel do que deveria, e que se passaram horas demais, dias demais, enquanto eu gastava pensamentos com o que precisava de muito menos.
Sim, estou triste. Profundamente triste porque tem coisas nessa vida que fogem ao nosso alcance, por mais esforço que façamos ao esticar os braços.
Só posso dizer que orgulho é pouco quando olho aquelas duas. E se um dia eu tiver metade daquela força, eu juro que vou acreditar que mereço ter mais paz do que eu tenho agora.
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